AMA DE LEITE
Era manhã de uma segunda-feira no árido verão do velho Junco, uma pequena cidade localizada nas entranhas do sertão baiano, quando um grito desesperado cortou o silêncio da velha casa de Dona Ana Dias.
Sua filha do meio estava em trabalho de parto. Era dia de feira na cidade e todos os amigos e familiares que moravam na roça, vinham “se arranchar” com Dona Ana. Era homem, mulher, criança, idoso, moça velha, e um mundaréu de gente correndo pela casa, entrando e saindo para depositar as mercadorias compradas ou para renovar o estoque das mercadorias que vendiam na feira.
Para parir sossegada, a filha de Dona Ana exigiu que naquele quarto simples, onde havia apenas uma cama com colchão de mola e um guarda-roupa antigo, um cabideiro velho onde penduravam um guarda-chuva e um jaleco de couro que o marido de Dona Ana usava para ir negociar na feira livre, só ficassem Dona Joana, a parteira da cidade, e sua assistente.
O marido, aflito com a chegada do primeiro filho, refugiou-se na bodega de Tonho com os amigos fiéis tomando “Jurubeba Leão do Norte” e andando de um lado para outro, bebendo e fumando para aliviar a ansiedade. Ao ouvir o grito desesperado de sua mulher, saiu em disparada. Entrando afoito pelo longo corredor da casa, perguntou aflito:
- O moleque nasceu? O moleque nasceu?
Naquela época na cidade não havia hospital, médico ginecologista ou obstetra, exame pré-natal, muito menos exame de ultrassonografia. Por isso havia também a ansiedade para saber o sexo do bebê.
Dona Joana, mãe Juana, como todos a chamavam, respondeu de dentro do quarto sem porta e com uma cortina de voal azul-turquesa:
- É uma menina, cabra safado!
A notícia frustrou os sonhos do pai, que sentou-se no chão, com as duas mãos sobre a cabeça, lamentando o infortúnio de não ter um homenzinho.
Dona Ana, a avó de primeira viagem, tentava acalantar o genro tão querido:
- Fique calmo, meu filho! O que importa é que nasceu com saúde! - disse-lhe calmamente, como se querendo confortar a si mesma.
Aquela menina recém-chegada ao mundo foi batizada com o nome da avó, que também foi escolhida como sua madrinha, e amamentada por mãe Juana, a negra de peitos fartos, que além de trazê-la ao mundo, foi sua ama de leite. Inclusive, dizem na região, que muitos dos que nasceram naquela época podem considerar-se irmãos, pois, mamaram nas mesmas tetas daquela negra espetacular.
Professora Ana,
ResponderExcluirLindo, simples e transmite um ar de campo-cidade para todos nós.
Parabéns,
Valdelice